quinta-feira, 3 de março de 2011

Incendedor de palitos...

Podia ver tudo do alto, do meio e de baixo. E até de mais baixo ainda. A terra úmida acolhia as raízes. Os locatários pagavam com canto e mel.
Foi cortada, libertada daquele pedaço de chão. Sabia que a transformação era inevitável. Tudo aconteceu tão rápido. O tempo acelerou. Poderia talvez ser interessante se desprender de um lugar para conhecer outros cantos do mundo. Viajou muitos quilômetros, viu cidades, viu pessoas. Foi dividida em vários palitinhos. Agora, além dos tons de marrom e verde que sempre a acompanharam, ganhou vermelho, azul, amarelo, rosa, carmim, anil, dourado, branco, verde-limão, bordô e outras mais. Cada palito de uma cor. Foi colocada dentro de uma caixinha. Jamais havia sequer cogitado caber em um lugar tão pequenino. Tentou se adaptar à nova moradia, mas era claustrofóbico lá dentro. Não havia luz, não se via as cores... A idéia de vários palitinhos coloridos em um lugar escuro era tentadora. Certa vez, abriram a caixinha, retiraram um palitinho amarelo com bolinhas laranjadas e o riscaram contra a superfície polvorosa daquele quadrilátero de papelão. Luz. Foi possível ver as cores, mesmo que por um breve instante. Um cigarro foi aceso, o palito foi balançado duas vezes antes do que restou dele retornar para a caixinha, no sentido contrário a todos os outros palitos. Um resquício resistente de brasa despertou todos os fósforos de uma vez. Tudo se queimou. A caixinha foi ao chão e se acabou em preto e tons de cinza. Não mais era uma caixa com fósforos coloridos que antes ainda era uma árvore. Deixou de ser. Choveu. E escorreu pelo asfalto. Bueiro. Rio. Mar. Ar. Todo lugar.

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